No tempo de Salazar é que não era bom

Havia Respeito?

  • Desde a proibição de Partidos, à censura, até ao impedimento de todas as liberdades (associação, reunião e manifestação), havia opressão, havia medo, havia tortura e mortes. Respeito? Não! Apenas no Tarrafal, estiveram
    340 antifascistas que somaram entre
    eles dois mil anos, onze meses e cinco dias de cárcere e tortura, onde apenas
    lá foram 32 assassinados;

Os cofres estavam cheios de ouro? Justiça?

  • Ora se Salazar mandou enviar os pedintes para os meios rurais e proibiu o povo de andar descalço e mendigar, era porque havia miséria, desemprego, fome;
  • Esta subnutrição e miséria, levavam a que a esperança média de vida nos homens fosse entre os 36 e os 39 anos, das mortes (grandemente evitáveis) 30% do total devia-se a tuberculose, o Orçamento para a Saúde Pública estabelece-se em 1,2 escudos para cada cidadão e o número de camas de hospitais é de 24 para cada 10 000 habitantes, metade do país vive sem electricidade e a maioria das pessoas não tem saneamento e água potável, a iliteracia ronda os 80%;
  • O Regime estava subjugado ao capital estrangeiro (Inglaterra, EUA, etc), permitindo concessões ruinosas para a economia nacional, por exemplo entregava-se ao controlo britânico a produção e comércio externo de conservas, cortiça, resinas, etc;
  • Cerca de metade de todos os investimentos do Estado dividiam-se entre as despesas militares e despesas para assegurar o aparelho repressivo;
  • Em 44-45 dos já poucos que não sendo filhos da grande burguesia, conseguiam aceder ao ensino superior, milhares são afastados com a subida de 500% da propina;
  • As mulheres e os jovens ganhavam em média menos 50% realizando o mesmo trabalho. O funcionamento do país, lei após lei apenas faziam legal o roubo, o roubo da dignidade, da alimentação, da saúde, do trabalho, do salário, tornava legal e moralmente exaltante a exploração do homem pelo homem, o machismo, o racismo e o anti-comunismo.

Coragem hoje, abraços amanhã

Os anos passados em clandestinidade na luta contra o fascismo levaram-na a chamar-se Maria Helena, Marília, Benvinda. Hoje, é Conceição Matos, reconhecida resistente anti-fascista, continuando a ser uma orgulhosa militante do Partido Comunista Português. Os anos de luta e as prisões na PIDE deixaram-lhe memórias que, diz, “tenho o dever de contar”.

À medida que o tempo passa o risco de se perder a memória histórica aumenta. No caso de Portugal, chega-se a branquear o regime fascista. Como caracterizas a ditadura?

Há até quem negue ter havido fascismo em Portugal. No entanto, os 48 anos de ditadura significaram miséria extrema, carência alimentar, na saúde, na educação, brutal exploração, prisões, torturas, crimes.

Só no campo de concentração do Tarrafal foram assassinados 32 antifascistas. As acções reivindicativas nas fábricas, campos e escolas eram reprimidas, muitas vezes com prisões. As mulheres eram cidadãs de segunda. O não esquecimento do fascismo e das transformações que o 25 de Abril trouxe é uma forma de lutar pela liberdade.

Estiveste presa pela PIDE duas vezes, pela tua actividade contra o regime. A primeira vez um ano meio, entre 1965 e 1966. Como foi?

Foi horrível. Só quem passou é que sabe. Cheguei a uma altura em que achava que ia mesmo morrer. Mas o Partido dava-me força. Fizeram-me a tortura do sono, passava noites sem dormir. Às tantas já se tem alucinações. Mas nunca falei. Deram-me espancamentos brutais. Mas o que me custou mais não foram os espancamentos, foram as torturas morais. Despiram-me duas vezes. Da primeira vez, obrigaram-me a fazer as necessidades no chão e que eram limpas com a minha roupa. Disseram-me que dali só saía ou para a morgue ou para o Júlio de Matos. Da segunda vez ameaçaram que me iam despir completamente, e assim o fizeram. Depois, as PIDES empurraram-me para o pé de um grupo de dez homens. Gritei: são uns monstros! Um dia o povo há-de se vingar! Fui brutalmente espancada por uma PIDE. Depois chegou um fotógrafo para me fazer a tortura do flash. Sentaram-me numa cadeira, a darem-me murros no queixo para olhar directamente para o flash. Isto durou horas e horas. Disse-lhes: não tenho nada para dizer à polícia. Lá dentro aprendi a comunicar com os outros presos. Ouvia-os a bater nas paredes, tipo morse. Fui ouvindo e decifrei o código que usavam. Às tantas consegui comunicar com eles. Perguntaram-me: “falaste?”. Eu disse que não. Responderam-me: “amiga, coragem hoje e abraços amanhã”.

E a segunda prisão?

Foi em 1968. Estive presa dois meses e meio. Quando cheguei a uma das salas de tortura da PIDE, disse: foi aqui que me deram cabo da saúde. O inspector Tinoco, que me tinha torturado na primeira prisão, respondeu-me: “tenho muita honra em ter-lhe dado cabo da saúde. Tenho muita pena de não lhe ter dado cabo da vida”.

Que formas de luta utilizavas na clandestinidade para combater o fascismo?

Trabalho de agitação, distribuição de Avantes, escrevia materiais do Partido na máquina de escrever, cuidava da casa e vigiava-a. Tinha que fazer parecer que éramos [Conceição e o companheiro, Domingos Abrantes] pessoas com vidas normais. Tive vários pseudónimos, fui Maria Helena, fui Marília, fui Benvinda.

Onde estavas no 25 de Abril? Como o viveste?

Nesse dia estava em Paris, onde eu e o Domingos vivíamos desde 6 de Fevereiro de 1974, pois o Partido tinha-nos destacado para tarefas exteriores. Foi na rua, no encontro com um camarada, que soube do golpe militar. O Domingos estava em Bruxelas. Eu sabia pouco do que se estava a passar. Quando vi na TV francesa a Junta da Salvação Nacional com o Spínola e a seguir canções do Zeca Afonso fiquei confusa. Mas, à medida que ia recebendo mais informação, a alegria e a confiança avançaram. Especialmente no dia que libertaram os presos. Foi um momento emocionante e inesquecível.

Que mensagem queres deixar aos jovens nestes 42 anos do 25 de Abril?

Uma mensagem de confiança de que por muito difícil que seja o caminho, mais tarde ou mais cedo as esperanças que Abril abriu serão realizadas. Que os nobres ideais do socialismo e do comunismo triunfarão.

Mas esse futuro não cairá do céu. Constrói-se com a luta constante. Confio que os jovens comunistas de hoje e amanhã serão como sempre foram construtores empenhados do futuro.

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Como se fez o 25 de Abril?

Foram 48 anos de ditadura fascista em Portugal. 48 anos em que, apesar da dura repressão do regime, nunca deixou de haver quem lutasse contra o fascismo, pela democracia e a liberdade. Foram todas as lutas, umas maiores outras mais pequenas, mas todas de grande significado e importância, que criaram as condições para o derrube do fascismo e para a madrugada libertadora do 25 de Abril. Lutas em que os comunistas estiveram sempre presentes, sendo o PCP o único partido que resistiu durante toda a ditadura mantendo sempre actividade e a sua direcção política dentro do território nacional, com vários exemplos de heroísmo na resistência às mais duras provações impostas pela clandestinidade, incluindo a prisão e a morte de muitos comunistas.

É importante relembrar o papel que a juventude teve ao longo dos anos na luta anti-fascista. Damos aqui apenas alguns exemplos de como a luta foi fundamental para derrubar o fascismo:

ANOS 30

A juventudarrastao.blogs.sapo.pte esteve presente desde os primeiros momentos em que a luta anti-fascista se afirmou. Logo em 1934, no culminar de um longo processo de luta contra a fascização dos sindicatos e contra o governo de Salazar, temos o marco da greve geral dos operários vidreiros na Marinha Grande a 18 de Janeiro, em que os trabalhadores chegaram a tomar o poder naquela localidade, a que se sucedeu uma brutal repressão pelo fascismo. Segundo os participantes nesse momento alto da luta anti-fascista, havia uma grande influência das Juventudes Comunistas nas fábricas, nomeadamente junto dos aprendizes.

Anos 40 e 50

Apesar da brutal repressão, houve ao longo dos anos diversos focos de luta dos jovens contra o fascismo, nas escolas (liceus, escolas industriais e comerciais, universidades), e nas empresas. Das várias estruturas, destacamos o Movimento de Unidade Democrática Juvenil (MUD Juvenil) que foi criado para dar expressão a essa luta, aproveitando todas as possibilidades de actuação política legal, articuladas com um trabalho clandestino e semi-legal.

O MUD Juvenil teve uma grande importância na criação de Associações de Estudantes e na eleição de dirigentes agualisa6.blogs.sapo.ptassociativos comprometidos com os valores democráticos. A influência e mobilização do MUD Juvenil foi ainda determinante para contrariar a influência da organização para-militar criada pelo regime fascista, a Mocidade Portuguesa, que apesar de ser de participação forçada para muitos jovens, nunca conseguiu ter a mesma capacidade de mobilização do MUD Juvenil.

Das muitas lutas e acções anti-fascistas que poderiam ser citadas, destacamos a Semana da Juventude, que foi lançada pela Federação Mundial da Juventude Democrática (FMJD, estrutura da qual actualmente faz parte da JCP) em Março de 1947 e que teve expressão em Portugal por diversas actividades organizadas pelo MUDJ, entre as quais um acampamento de jovens em defesa da democracia, realizado em Bela Mandil, no Algarve, e que foi brutalmente reprimido pelo fascismo. É daí que o 28 de Março foi consagrado, após a Revolução de Abril, como o Dia nacional da Juventude, lembrando esse marco do movimento democrático juvenil.

Anos 60 e 70

Os primeiros anos da década de 1960 são marcados por grandes lutas anti-fascistas: a fuga de Peniche e outras fugas das prisões políticas do fascismo; o desencadeamento da luta de libertação nacional em Angola; as grandes lutas dos trabalhadores agrícolas do Alentejo e Ribatejo que resultaram no alcançar da jornada de 8 horas; as manifestações do 1.º de Maio de 1962, que em Lisboa tiveram mais de 100 mil manifestantes; entre outros exemplos – lutas que marcam um ascenso da luta anti-fascista, e em que a juventude esteve sempre presente.

É nesse contexto de avanços na luta que se dá o ascenso do movimento estudantil, que se inseriu na dinâmica de luta do movimento democrático e anti-fascista. Das muitas lutas académicas, destacamos a grande Crise Académica de 1962, marcada por diversas greves, manifestações, luto académico e outras formas de luta dos estudantes, dando origem à consagração do 24 de Março como Dia do Estudante. A grande greve estudantil de 1969 em Coimbra é também um marco na luta dos estudantes.

Muitos outros exemplos poderiam ser citados, desde candidaturas presidenciais, congressos, manifestações pela Paz e contra a guerra colonial, amplas mobilizações de massas que deram frutos em Abril de 1974 e no período que se lhe seguiu.