CAMPANHA DE JOVENS TRABALHADORES DA JCP EM ÉVORA Contra medos e preconceitos
13-Mar-2005
A importância da sindicalização como forma de os trabalhadores defenderem os seus direitos foi uma das questões centrais da campanha desenvolvida no distrito de Évora pela JCP nos últimos meses. Quatro militantes falam das suas experiências e mostram-se satisfeitos com os resultados.

A campanha de contacto da JCP com jovens trabalhadores começou em Outubro, no distrito de Évora. Cerca de 30 pessoas estiveram envolvidas nas iniciativas, entre elas Patrícia Machado, Ana Chambel, Valter Lóios e Inês Cruz (por esta ordem nas fotos). Como em todas as regiões, o trabalho começou por aprofundar o conhecimento sobre algumas empresas e, a partir daí, fazer os panfletos. Ana Chambel, militante da JCP desde Setembro, foi uma das pessoas que mais se envolveu na campanha. «No início foi estranho, porque não conhecia praticamente ninguém na organização, mas comecei a ambientar-me e cada vez gosto mais. Tenho pena que seja tão complicado conciliar o trabalho, a escola e a JCP, mas vou fazendo um esforço. Agora é quase uma missão esclarecer as pessoas. A maior parte dos jovens não conhece os seus direitos», considera.

A fábrica Tyco, em Évora, a Fapradiv, em Arraiolos, a Fabrimar, em Borba, a Câmara Municipal, o centro de emprego e o centro de formação de Vendas Novas foram alguns dos locais visitados. A importância da sindicalização é uma das questões mais abordadas durante a campanha, embora sem os resultados desejados porque se generalizou o medo das represálias por parte da entidade empregadora.

«Há também uma grande campanha de descredibilização dos sindicatos e do seu papel. Ao longo do último ano, as pessoas que falam connosco dizem que há esse medo e que dentro das empresas dizem que “os sindicatos andam cá para se amanhar”. Torna-se ainda mais necessário este trabalho de informação e consciencialização», refere Patrícia Machado.

Ana Chambel parte da sua experiência pessoal para explicar as razões por que os trabalhadores se devem tornar sócios dos respectivos sindicatos: «Quando trabalhei no comércio, decidi sindicalizar-me por notar que seria em meu benefício e dos outros trabalhadores. Foi uma grande ajuda para definir a minha situação: trabalhava há dois meses e não tinha contrato, tinha um horário muito alargado... Ganhei informação sobre os meus direitos e soube os passos que deveria dar. Com a ajuda do sindicato, consegui que o patrão me pagasse tudo a que tinha direito.»

Este apelo directo à sindicalização justifica-se, porque, como explica Patrícia, «estamos numa luta comum: a defesa dos direitos dos trabalhadores. Os patrões organizam-se e discutem como é que vão aumentar os lucros, o que em geral não é compatível com os direitos dos trabalhadores, por isso é normal que nós também nos organizemos. Estamos a ajudar, a contribuir para fortalecer a importância dos sindicatos», salienta.

Valter Lóios considera que é mais fácil serem jovens a falar sobre a importância da unidade e da luta com outros jovens trabalhadores. «E, ao valorizarmos a JCP, estamos a dar um contributo essencial para a união dos trabalhadores em geral», refere.


Combater os medos

Em Arroiolos, na Fapradiv, uma empresa de 70 trabalhadoras, há apenas sete sindicalizadas. «Aquelas jovens trabalhadoras têm medo de intervir em seu benefício. Dizem-nos que têm o contrato de quatro anos a acabar e que tinham medo que o patrão não o renovasse, mas punham a hipótese de se sindicalizarem se entrassem para o quadro da empresa. Argumentámos que é importante os trabalhadores estarem unidos numa organização própria para se defenderem em conjunto e que é possível ser sócio do sindicato sem que o patronato saiba, mas, mesmo assim, elas têm medo», diz Valter Lóios.

A administração da empresa já passou das ameaças para as acções. As funcionárias sindicalizadas foram colocadas onde se produz menos para não receberem os prémios de produtividade «e o patrão até lhes diz que elas não produzem muito por serem sindicalizadas, e não por estarem a ser constantemente mudadas de secção».

A JCP também contactou trabalhadores da construção civil, mas muito poucos reconhecem a importância da sindicalização. «Trabalham 8 ou 9 horas por dia, recebem 130 ou 140 contos por mês, o que é considerado um bom vencimento e talvez esteja acima do valor da tabela. Não vêem o outro lado, que não são feitos descontos para a segurança social, que não recebem subsídios de férias e de Natal e que cada operário tem de fazer todos os trabalhos independentemente de ser servente ou pedreiro. A categoria só serve para o ordenado. Ainda valorizam o facto de o patrão lhes dar as botas de biqueira de aço e o capacete, apesar de não lhes dar a roupa… Até os materiais de trabalho são muitas vezes comprados por eles próprios, como pás e martelos», afirma Valter.

O desemprego, sendo um problema de todo o País, sente-se particularmente no Alentejo e também é usado como ameaça pelo patronato. «Temos de ter em conta a sociedade actual. Pessoas a pagar casa, com filhos, não se podem dar ao luxo de serem despedidas», comenta Patrícia.

Inês Cruz, desempregada há dois meses, já tem histórias tristes para contar. Uma delas teve como palco o Centro de Emprego: «Disseram-me que não tinham solução para mim. Os cursos que têm é para fazer o 9.º ano, mas eu tenho o 9.º ano. Inscrevi-me num curso de geriatria, mas já estava cheio. Tenho ido a várias entrevistas, mas ainda não consegui nada…»

Os exemplos do desespero dos desempregados multiplicam-se, a par de casos de patrões sem escrúpulos. É comum os trabalhadores estarem um mês à experiência, sem receberem ordenado e no fim serem despedidos.

Há inúmeras inscrições para uma fábrica que vai abrir na região em 2006, apesar de ainda não se saber as condições e os salários.


O exemplo de Borba

«Para além da campanha directa que fazemos com os panfletos, com as faixas ou com as notas para a comunicação social, temos conversas individuais ou em grupo com trabalhadores que depois consciencializam os colegas, os familiares e os conhecidos. Cria-se uma rede – com muita dificuldade, passinho a passinho, sem resultados imediatos muitas vezes – que mostra que vale a pena continuar com este tipo de trabalho e que vai tendo frutos», declara Patrícia Machado.

O caso da Fabrimar, uma empresa de mármores em Borba, ilustra as palavras da responsável da JCP. «Não temos organização na localidade, mas conversámos com um grupo de jovens trabalhadores. Um deles estava extremamente desiludido e descrente, achando que não havia nada a fazer, que as pessoas não ganhavam consciência, que isto ia ser sempre assim», conta. Os trabalhadores desta empresa não recebem o pagamento pelas horas extraordinárias e têm os subsídios de férias e do Natal em atraso, questões que foram analisados em documento pela JCP. «Esse rapaz propôs-se distribuí-lo no autocarro a caminho da empresa por ser o sítio de maior concentração de trabalhadores. Geraram-se automaticamente conversas e, uns dias depois, quando o patrão voltou do estrangeiro, decidiram ir falar com ele para resolver os problemas. Foi feita uma reunião e foi prometido o pagamento do dinheiro em atraso. Ele, que estava tão desmobilizada ao início, ficou muito mais animado. “Nunca pensei que o panfleto pudesse dar tanto resultado”, dizia. Nós próprios ficámos surpreendidos, porque não esperávamos resultados imediatos. Depois é importante não deixar cair, o que nem sempre é fácil», refere Patrícia.

A campanha terminou no fim de Fevereiro, mas os contactos prosseguem, o que significa que, na prática, continua. «Este tipo de acções potencia o trabalho futuro com todas as pessoas que recrutámos e com as que não recrutámos mas com quem mantemos contacto e que querem trabalhar connosco», declara Patrícia.


Ser comunista no Alentejo em 2005

É corrente a ideia que no Alentejo «só há comunistas». Será assim? O trabalho a JCP é assim tão fácil? A realidade é bem diferente. «As pessoas recebem muito bem os nossos documentos, há receptividade, mas não há muitos que se queiram envolver», diz Inês Cruz «Há uma campanha nacional de preconceito em relação ao PCP. Uma pessoa afirmar-se como comunista não é tão fácil como ser de outra área política. Num local de trabalho um comunista é identificado como tal, não é o mesmo que ser o único sportinguista», explica Patrícia Machado. «As pessoas dão-nos razão em muita coisa, estão disponíveis para ouvir, mas dar o passo é mais complicado. Em termos de organização, já tivemos melhores e piores dias, mas temos condições para melhorar», assegura.

Num ambiente de grande desinformação e de apelos contrários à militância numa organização como a JCP, como é possível novos recrutamentos? Valter Lóios responde: «Os jovens têm uma opinião sobre o País e a adesão à JCP surge a partir do reconhecimento do nosso trabalho e das nossas ideias.» Patrícia sublinha a proximidade da JCP em todos os domínios sociais. «Nós somos iguais a todas as pessoas e as nossas preocupações são como as delas, embora algumas possam ainda não ter percebido isso. É também uma questão de despertar consciência de classe», afirma, contando o caso de uma muito recente militante, trabalhadora da Tyco que se inscreveu durante a campanha, que comentava que a JCP era a única organização que aparece com frequência na empresa. «Ainda antes de ela se inscrever, um colega acusou a JCP de querer manipular a luta e ela, sozinha, desmentiu-o dizendo que a luta é dos trabalhadores, que nós apoiamo-los e que somos os únicos que lá vamos, às sete e meia da manhã ou da tarde», acrescenta.

Em 2004, inscreveram-se 60 novos militantes no distrito e os responsáveis da organização estão confiantes em novos recrutamentos, nomeadamente de jovens que se sindicalizaram e que gostaram da campanha e das propostas. Está em preparação igualmente a criação de novos colectivos de jovens trabalhadores em Arraiolos, Vendas Novas e em algumas empresas da região.

«Onde aparecemos e onde trabalhamos temos experiências positivas», refere Patrícia, dando o exemplo da venda do Avante!. «Vendemos sempre que fazemos bancas. Recentemente, à porta de um supermercado, vendemos 20 jornais em menos de uma hora e havia pessoas que diziam que já o tinham em casa.»


Repressão e ameaças na Tyco

A Tyco, uma empresa das indústrias eléctricas a funcionar em Évora, emprega cerca de 1500 pessoas de todo o distrito e dela dependem várias outras empresas fornecedoras de material. Mas esta grande empresa tem uma outra face, nada positiva: a repressão, as ameaças e os despedimentos.

Só na última semana, 10 operárias perderam o emprego. Muitas pessoas têm sido convencidas a rescindir contrato ou a não renová-lo. Quem é visto a falar com um delegado sindical é alvo de pressão. O estatuto do trabalhador-estudante não é reconhecido.

«Cada sector tem um cartão, independentemente de ter 20 ou 30 trabalhadores, e cada funcionário tem de o usar para as pausas. Em quatro horas, há uma hora de pausa para aqueles trabalhadores todos irem à casa de banho, comer, fumar um cigarro, descansar... Se alguém for à casa de banho sem avisar o chefe de secção é ameaçado de despedimento», conta Patrícia Machado.

Os delegados sindicais têm um tratamento especial. Muitos foram suspensos e depois despedidos depois de um documento sindical acusar a administração de oprimir os trabalhadores. «Empregadas da Tyco dizem agora que foram colocadas câmaras de vídeo nas casas de banho, que operários sindicalizados foram despedidos ou estão na reserva, que não recebem o ordenado, que ninguém se assume como delegado sindical com medo», enumera Inês Cruz. «Isso mostra que os sindicatos fazem frente às injustiças, que contribuem para resolver os problemas dos trabalhadores e por isso a administração os teme», reflecte.

Há dois meses, decorreu uma acção de luta com cerca de 50 trabalhadores. «Pode parecer um número pequeno, mas há anos que não se fazia nada. Foi uma grande vitória e assustou o patronato, a tal ponto que as medidas repressivas se agudizaram. Quem participou na concentração foi despedido ou mudado de turno ou de sector. Algumas mulheres foram para os plásticos, a secção mais dura fisicamente, habitualmente só com homens», afirma Patrícia.

Um outro objectivo da administração é provocar o medo nos trabalhadores com a deslocalização da empresa.

Recentemente foi projectado um filme na fábrica, mostrando que em 2010 a empresa se vai mudar para um país de Leste da Europa, apesar de ter muitas encomendas e de continuar a receber fundos europeus por se ter instalado na região. «A administração quer deixar os operários muito mais flexíveis para as suas medidas: “Se não aceitarem trabalhar mais horas por menos dinheiro, vamo-nos embora.” As pessoas estão com muito medo de perder o emprego. Jogam com o desespero dos trabalhadores para deixá-los à mercê da exploração», salienta Patrícia.

Nos últimos meses, a JCP distribuiu panfletos à porta da empresa três vezes. As visitas foram marcadas pelo bom acolhimento dos trabalhadores e pela má recepção por parte da administração. Na segunda visita, os seguranças impediram a distribuição dos documentos e ameaçaram chamar a polícia; na terceira, a PSP foi mesmo ao local. «Depois dos trabalhadores estarem mais alertados, a empresa começou a levantar problemas nas distribuições», lembra Ana Chambel.


Os mais jovens, os mais explorados

Os trabalhadores mais jovens são, em geral, as primeiras vítimas de patrões menos escrupulosos, pelo grande desejo de arranjarem um emprego, por desconhecerem os seus direitos e por terem ainda dificuldades em identificar as situações de injustiça. «É uma mão-de-obra muito mais facilmente gerível pelas administrações, mas quando os questionamos directamente eles percebem o que está em causa: “Achas justo trabalhar 11 horas por dia a maior parte da semana?”», diz Patrícia Machado.

O número de jovens operários tem aumentado nos últimos anos, «porque não arranjam emprego na sua área de estudos, nomeadamente licenciados», refere Ana Chambel. «Outros ainda estudam na Universidade de Évora e estão ali para sustentar os gastos», acrescenta.

«No horário nocturno, a Tyco e a Epcus parecem escolas secundárias. Há alguns jovens que nem devem ter 18 anos», comenta Patrícia, lembrando que, em pequenas localidades como Portel, adolescentes com 14 ou 16 anos deixam a escola para ir trabalhar. «Ali não há ensino secundário e quem queria continuar a estudar depois do 9.º ano tem de fazer 40 quilómetros todos os dias. Mas também não há trabalho, a agricultura está desfeita, no dia de atendimento da Câmara Municipal há filas de pessoas a pedir emprego e estes jovens vão para as obras.»

in Avante!, n.º 1632, 10 de Março de 2005

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